quinta-feira, 12 de março de 2015

A FALTA DE POLITICAS SOBRE O TEMA EQUIPAMENTO DE SEGURANÇA DE SKATE E SUAS CONSEQUENCIAS







Andando de skate há mais de 30 anos você acaba percebendo que os ciclos se fecham, na mesma proporção que as marcas, a modinha e algumas amizades.

Chegar a uma pista de skate e vestir-se de todos os equipamentos sempre foi quase que um ritual , atos  mágicos na vida de muitos que ainda andam no carrinho, pois ao fechar velcros de joelheiras, cotoveleiras e wristguards, clicar o fecho do capacete, aquela pessoa se sente segura, tranquila e protegida, para dar seus roles em qualquer lugar, até porque enquanto seus equipamentos são colocados, quase sempre observa-se a pista e muitas vezes já traçam o que fazer, onde fazer e como fazer. 

Hoje recebemos a triste notícia do falecimento de um skatista na cidade de Niterói, em uma pista inaugurada há pouco mais de um mês. Ele estava sem capacete e não sobreviveu ao dano causado por sua queda, infelizmente. Torcemos para que a família seja confortada e amparada. 

Mas e se a pista tivesse obrigatoriedade do uso de equipamentos? Muita coisa seria diferente para todos. 

Há muito tempo brigamos pelo entendimento de que o uso de equipamentos de proteção seja obrigatório em todos parques e eventos da modalidade, mas a "modinha" de andar "pelado" chegou e, para quem não usa nem capacete, colocar outra opinião na cabeça dessas pessoas é difícil.

Ainda há os que pregam a máxima "Skatista profissional sabe cair!" -  Infelizmente o skate não é como o judô, onde a queda é esperada e treinada, na verdade tanto faz um tombo de rolé de domingo na Vieira Souto, como uma queda tentando um 540 em um bowl por um profissional. No fim das contas é igual e proporcional em velocidade, altura e intensidade.

Mas vamos tentar desenvolver o que é necessário, com duas perguntas básicas:

1) há leis que obrigam o uso de equipamentos?

2) de quem é a culpa pela falta de uso de equipamentos?

3) colocar placas dizendo que é obrigatório ajuda?

Para a primeira pergunta temos a considerar que o skate no Brasil, apesar de ser o segundo esporte mais praticado, mantém-se na marginalidade e prefere estar assim. Aliás, sequer gostamos de ser chamados de esportistas. 

No estado da Califórnia, EUA, uma lei regulamenta o fato há décadas, impondo o uso de equipamentos de segurança a todos que usem skateboards, bikes, patins e patinetes em locais públicos, skateparks públicos ou particulares com acesso público. Em 2009 o deputado Saldanha apresentou uma proposta de alteração da lei, alterando o texto para que apenas os menores de 18 anos sejam obrigados ao uso completo de equipamentos, mas que o capacete seja obrigatório em todos os parques. Além dessas considerações a própria lei determina a obrigatoriedade de advertências acerca da obrigatoriedade do uso do capacete e aplicação de multa, pelas forças policiais a quem não respeitar o regulamento.  

Isso nos remete à segunda pergunta, pois no Brasil a responsabilidade civil existe e não tem exclusões radicais como nos EUA.

Mas vamos entender, ainda que haja declaração expressa de que o skatista abra mão de eventual responsabilidade, essa não se aplica, é o que legalmente temos como cláusulas excludentes de responsabilidade civil, parecidas com aquelas que alguns estacionamentos colocam na parede "não nos responsabilizamos por objetos deixados no interior dos veículos". Bullshit!!!!! Não há essa exclusão.

A legislação brasileira quanto a responsabilidade civil é contundente e implacável quando há o ato e seu resultado danoso. Esse ato pode ser omissivo ou comissivo e, no caso de permitir que a pista de skate seja utilizada sem equipamentos de segurança, uma vez causado o evento danoso, o responsável pela pista também será o responsável civil pela indenização dos danos causados por sua omissão. SIMPLES HANN??

Os fundamentos da responsabilidade civil no Brasil se encontram no Código Civil de 2002, no art. 186, que considero importante transcrever "ipsis litteris":

"Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Enfim, não dá para escapar se o evento/acidente aconteceu no seu quintal, na pista da marca X ou na pista pública.
Na Meca do skate mundial, a legislação Californiana sofreu algumas mudanças em 2009 com a proposta do Saldanha e desde então as pistas são obrigadas a manter seguro de acidentes, placas indicativas de obrigatoriedade do capacete e identificação diferenciada aos menos de 18 anos, ou seja, uma pulseira de cor diferente. Além disso a Califórnia obrigou todos os skateparks, inclusive os públicos ou particulares com uso público, ao preenchimento de um termo de responsabilidade e concordância com as regras e leis, demonstrando que as pistas não agiam com culpa in vigilando (deixar de prestar atenção ao contrato e seu cumprimento). Não bastasse tal situação, a corte californiana, que trabalha com skate e acidentes há décadas antes da do Brasil, apresentou parecer de que não aplicaria a responsabilidade civil nos casos de skatistas maiores em praças públicas, por considerarem a atividade perigosa e que os praticantes estariam assumindo esses riscos, MAS NÃO NOS CASOS DE SKATEPARKS. Sem contar, claro, nas multas que podem chegar à 1500 dólares e são aplicadas por policiais locais.

Na terceira questa temos que repetir: dizer que é obrigatório e não fiscalizar faz da pista e de seus proprietários tao responsáveis quanto, pois incidem em culpa in vigilando, ou seja, deixaram de observar a regra e deixaram de fiscalizar. 

Enfim, falta no Brasil a inteligência do Estado em legislar sobre o tema, bem como dos administradores públicos de imporem regras ao uso das pistas publicas. Falta no brasil a imposição do uso de equipamentos de segurança em eventos, com ou sem transição televisiva, independe da condição do competidor, profissional ou não. Falta, ainda, o profissionalismo dos skatistas profissionais e de seus patrocinadores (empregadores) na obrigação do uso dos mesmos em todos eventos, fotos e campanhas publicitárias, incentivando o uso dos mesmos.

Concluindo, infelizmente, ainda falta ao Brasil conhecer de desgraças e grandes processos judiciais e administrativos, para se ver a integridade física, mental, social e familiar integra e fazer valer o certo. 

Que o backstage do skate brasileiro não se silencie perante as verdades e que as cabeças trabalhes juntas pelo bem estar de todos, inclusive como exemplos a todos que estão começando a pratica do carrinho. 

USEM CAPACETE E BOAS SESSIONS!!!!



Sobre o autor: Alexandre A. Costa é amigo, advogado, professor, presidente do TJD da Confederação Brasileira de Skate, formado em Ciências Jurídicas e Sociais, especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Master of Business Administration em Direito Empresarial, organizador de eventos de skate e skatista desde 1981... e insistente na obrigatoriedade do capacete

Para citar o autor: - Costa, A. A.